Por : Alexandre Soares
Documentos revelam que programa responsável por combater a poluição sonora na capital está à beira da inoperância por falta de pessoal e estrutura
O Programa de Silêncio Urbano (PSIU), setor da Prefeitura de São Paulo responsável por fiscalizar e combater a poluição sonora na cidade, está em colapso. Um relatório técnico obtido com exclusividade pela reportagem, com base em documentos oficiais do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), revela graves deficiências estruturais e um déficit crítico de fiscais de posturas, que tornam ineficaz a atuação do órgão.
Procedimento investigativo do MP expõe falhas
Desde 2012, o Ministério Público acompanha a atuação do PSIU por meio do Inquérito Civil nº 14.0482.0000049/2012-9. Em 2021, diante da falta de avanços, foi instaurado o Procedimento Administrativo de Acompanhamento (PAA 185/2022) para monitorar especificamente duas promessas da Prefeitura: a modernização dos tablets utilizados pelos fiscais e a atualização do sistema de gerenciamento das fiscalizações.
Porém, documentos oficiais demonstram que nenhuma das melhorias foi efetivamente implementada. O próprio MP constatou que os tablets alegadamente “modernizados” haviam sido comprados antes mesmo da instauração do procedimento. Além disso, até hoje a Prefeitura não conseguiu informar quantos fiscais estão atuando nas ruas.
“É facilmente perceptível que não houve qualquer modernização dos tablets”, afirmou o promotor Fernando César Bolque, titular da 3ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente da Capital.
Cidade sem fiscalização: a lei não é cumprida
A reportagem teve acesso a ofícios enviados pelo MP à Prefeitura exigindo informações básicas como:
Quantidade de fiscais de campo;
Volume médio de fiscalizações por mês;
Equipamentos disponíveis e datas de aquisição;
Demandas urgentes do programa.
Apesar de reiteradas cobranças, a Prefeitura evitou ou atrasou sistematicamente as respostas, indicando possível desorganização interna e, principalmente, falta de pessoal suficiente para cumprir a lei.
“É um cenário de ineficiência operacional evidente. A população denuncia, mas não há quem fiscalize”, diz um aprovado no concurso de fiscal de posturas da cidade, que preferiu não se identificar.
Dados alarmantes:PSIU opera com estrutura defasada
Segundo o relatório técnico encaminhado ao MP, a deficiência de fiscais é a principal causa da inoperância do PSIU. Especialistas afirmam que não basta modernizar sistemas digitais se não houver servidores públicos suficientes para operar o serviço.
A cidade de São Paulo deveria contar com mais de 1.200 fiscais de posturas, conforme previsão da Lei Municipal nº 17.913/2023. Entretanto, menos da metade desse contingente está em atividade, e a maioria atua em setores diferentes da fiscalização de ruídos.
Ministério Público pode acionar Prefeitura na Justiça
Diante da omissão da administração municipal? Possíveis desdobramentos do caso PSIU:
A expedição de recomendação formal à Prefeitura para nomeação dos fiscais aprovados em concurso;
A celebração de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com prazos e metas;
Propositura de uma Ação Civil Pública, exigindo a recomposição do quadro funcional.
Arquivamento, caso a administração resolva a questão da falta de recursos humanos.
“Sem fiscais, o PSIU é letra morta. A lei do silêncio não se cumpre por falta de quem a faça valer”, conclui o relatório técnico.
Enquanto isso, a população sofre com o barulho
A ausência de fiscalização tem consequências diretas na vida da população. Moradores de diversas regiões da capital relatam barulho excessivo em bares, festas clandestinas e estabelecimentos comerciais, especialmente à noite e nos fins de semana, sem qualquer tipo de repressão.
“O bar aqui da esquina vai até 3h da manhã com som ao vivo. Já cansei de ligar para a Prefeitura e não aparece ninguém. Disseram que o PSIU não dá conta”, diz Sandra, moradora da Mooca.
Conclusão: silêncio urbano, omissão pública
O caso do PSIU é mais um exemplo de como a falta de servidores públicos compromete o funcionamento das políticas urbanas e ambientais. A fiscalização, pilar essencial do ordenamento urbano, está à deriva na maior cidade do Brasil.
Enquanto o PSIU permanece paralisado pela falta de fiscais, os moradores seguem expostos ao barulho e à omissão. E o silêncio — ao menos por parte do poder público — parece ser o único garantido.
Fonte: https://fiscalizesp.com.br/