Ofício SAVIM nº 028/2013

Ofício SAVIM nº 028/2013

Ofício SAVIM nº 028/2013 

Ao MM. MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DE SÃO PAULO 

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR PROMOTOR DE JUSTIÇA 

HABITAÇÃO E URBANISMO – Dr. José Carlos de Freitas 

EXCELENTÍSSIMOS SENHORES DOUTORES 

PREFEITO DOUTOR FERNANDO HADDAD 

Excelentíssimos Srs. Drs. 

SECRETÁRIOS MUNICIPAIS E GABINETES 

Senhor Controlador Geral do Município - Dr. Mário Vinicius Claussem Spinelli 

Supervisora Geral do Uso e Ocupação do Solo – Marly Kiatake 

Coordenação das Subprefeituras – Francisco Macena da Silva 

Negócios Jurídicos – Luis Fernando Massonetto 

Senhores Doutores, 

Nos termos do artigo 8º, inciso III e artigo 37, inciso VI, da Constituição Federal da República, esta N. E. Sindical tem o dever legal de vir, respeitosamente, à presença de Vossas Senhorias, expor e manifestar o que segue: 

Há constatação de que estão sendo nomeados, de forma política, casuísta e sem critérios técnicos, funcionários pertencentes à carreira de Agente Geral de Políticas Públicas (AGPP - carreira cuja exigência para ingresso é a comprovação de nível médio) para ocuparem os cargos de Supervisor Técnico II - DAS12 e de Chefes de Fiscalização (nas SUBPREFEITURAS VILA MARIANA, SANTO AMARO, CAPELA DO SOCORRO e MOOCA, dentre outras e AMLURB).  A prática, em tese, pode afrontar o entendimento cristalizado e pacificado pelo C.STF na Súmula 685 e impõe prejuízo àqueles servidores ingressantes nas carreiras de nível superior, que exercem cargos e funções técnicas especializadas e são aptos para o desempenho dos misteres intrínsecos às funções públicas imperiosas ao cargo.

 

Estas nomeações políticas, conforme apurado, estão ocorrendo em atendimento a interesses pessoais de vereadores, que não estão preocupados com o bem-estar da população e do espaço urbano da Capital Paulistana, mas, sim e unicamente, tratam de aparelhar politicamente tais cargos, distorcendo a lei específica. Afrontando a Constituição Federal, se afastam dos princípios basilares do Direito Público Administrativo - eficiência, moralidade e legalidade, e do respeito às normas. 

Ademais, não se coaduna com os princípios da legalidade e eficiência nomear servidores públicos de carreira de nível médio (sem conhecimentos técnicos gerais e específicos) para ocuparem cargos e chefiarem equipes de servidores de carreira de nível superior (especializados e preparados para a função), soando até mesmo imoral, pois viabiliza o clientelismo e nepotismo. 

O fato de haver previsão que autorize a livre nomeação não afasta, por meio da hermenêutica jurídica e à luz dos princípios norteadores da administração pública - especialmente os Princípios da Impessoalidade, da Moralidade e da Eficiência, além do Princípio da Primazia do Interesse Público – a busca por desconstituir as teses de defesa para essas práticas que prejudicam e maculam os interesses sociais, neste caso os interesses urbanos. 

Assim, como bem ensina a eminente doutrina, o assunto está direta e proporcionalmente relacionado com a qualidade dos serviços públicos prestados à sociedade civil, bem como à eficiência do Estado, à moralidade e à legalidade. 

A distribuição política e aparelhada de cargos comissionados, já foram tratadas por diversos doutrinadores, sempre com o objetivo precípuo de expurgar da máquina pública o viés negativo da questão. Ou, ao menos, torná-lo menos danoso à ordem pública, fato que vemos ocorrendo de forma diametralmente oposta na atual administração, sempre em detrimento das carreiras técnicas e especializadas de nível superior. 

Afinal, a livre nomeação, ainda mais com conotação política e pessoal, reflete um passado pátrio imperialista que não pode mais encontrar lugar em um país democrático de direito onde figura entre os direitos individuais indisponíveis, o do tratamento isonômico entre as pessoas, com igualdade de direitos e deveres e, consequentemente, de oportunidade de acesso ao serviço público. 

O Supremo Tribunal Federal, a fim de suprir a ausência de regulamentação específica para a investidura de servidores públicos em cargos em comissão, editou o verbete da Súmula n.º 685. Nele é declarada inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público, em cargos que não integrem a carreira na qual anteriormente investido. 

Como bem sobredito, no caso em tela, outros princípios constitucionais norteadores da administração pública podem estar sendo maculados pelo mau uso da liberalidade constitucional, a saber, os da moralidade, da impessoalidade e da eficiência na administração.  No tocante a este último, a ausência de respeito e observação da situação de ingresso de nível superior em concurso público e pelo aspecto técnico específico, com certeza vem a impedir que os melhores, os mais preparados, desempenhem as funções que são de interesse da sociedade, vedando o ingresso por mérito dos mais capacitados, daqueles que trariam os melhores resultados para a administração. Nas palavras de Celso Ribeiro Bastos, mencionadas na obra de Pedro Roberto Decomain: "De fato, o concurso público respeita o princípio da isonomia, na medida em que todos podem nele se inscrever (é por isso que ele é público), e permite à administração selecionar os candidatos de maiores méritos”. 

É sabido e notório que o clientelismo se constata quando a nomeação ocorrer de uma forma de pagamento realizado pelo agente público a alguém que lhe prestou um favor político e pessoal, ou quando seja ao agente público proveitoso ter uma determinada pessoa exercendo certa função, tendo em vista algum tipo de favorecimento político e pessoal futuro. Tem-se, como exemplo clássico, a distribuição de cargos de direção de empresas públicas e de economia mista após o período eleitoral, geralmente, para pessoas ligadas aos partidos políticos que apoiaram o candidato vencedor. Os prejuízos decorrentes da última hipótese são óbvios: desvio de verbas para fundos partidários e afins, comprometimento do desempenho das empresas, licitações viciadas. 

No Brasil, o nepotismo e o clientelismo, principalmente este último, são as pragas que assolam a máquina pública, colocando em risco até mesmo o regime democrático, como é o caso da distribuição de cargos e outros benefícios em troca de votos no Congresso Nacional. Tem seu cerne no desvio de poder, a utilização de uma competência em desacordo com a finalidade que lhe preside a instituição. É a clássica definição nas palavras de André de Laubadère. 

Os princípios constitucionais da administração pública encontram-se relacionados no art. 37, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a saber: princípio da legalidade, princípio da impessoalidade, princípio da moralidade, princípio da publicidade e princípio da eficiência. 

Entre todos os princípios citados, o princípio da moralidade é o que possui conceituação mais abstrata. Considera-se imoral o ato da administração que, mesmo realizado dentro da mais estrita legalidade, viole os princípios éticos da razoabilidade e da justiça, condições que conferem validade ao ato da administração pública. 

Não é preciso, para detectar a natureza contrária à moralidade, descobrir a intenção do agente. O resultado fala por si só. Será considerado imoral o ato contrário ao senso comum de honestidade, retidão, justiça, boa-fé, respeito à dignidade do ser humano, ao tratamento isonômico entre as pessoas, à ética e respeitabilidade às instituições. Tais disposições não precisam estar normatizadas para que surtam efeitos, para que fundamentem a declaração de invalidade de atos administrativos, pois são inerentes aos princípios gerais do direito e existem por forças próprias. 

A moral administrativa, nas palavras de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, "corresponde àquele tipo de comportamento que os administrados esperam da Administração Pública para a consecução de fins de interesse coletivo, segundo uma comunidade moral de valores”. 

O dispositivo constitucional supracitado traz uma regra clara, não admitindo interpretação dúbia. Caracteriza-se como requisito necessário para promoção na carreira (leia-se, nomeação para funções de confiança, em cargos de chefia, direção e assessoramento) a participação do servidor efetivo em cursos de formação e aperfeiçoamento. Tal disposição se estenderia, também, àquela parcela mínima de cargos em comissão que estaria reservada para funcionários públicos, caso fosse editada e promulgada a lei citada no art. 37, V, da Constituição Federal de 1988. Porém, isto não impede que da leitura do dispositivo se tenha o seguinte entendimento: para investidura, seja em cargo em comissão seja em função de confiança, tem por condição essencial a prévia capacitação técnica e o pleno conhecimento das atividades desenvolvidas pelo órgão contratante, ainda mais, que as mesmas são destinadas às funções de liderança, direção e chefia, e assessoramento. 

Considere-se, ainda, que liderança, no que toca às funções de direção e chefia dos cargos comissionados ou de confiança, pressupõe pleno conhecimento da natureza das atividades realizadas pelo setor ou órgão sobre o qual será exercida. Desta feita, as nomeações motivadas tão somente pelo aspecto político poderão ser declaradas nulas por não se apresentarem harmônicas ao que, explicitamente, está disposto no texto constitucional, que é a necessidade de capacitação, formação técnica específica e, dependendo da função, prévia experiência, para se alcançar cargos de nível mais alto dentro da carreira. Então, aberrações, como a nomeação política de líderes sindicais operários para altos cargos da administração de empresas públicas, cujas funções exigem formação e conhecimento vasto nas rotinas executivas, poderiam ser declaradas nulas pelo Poder Judiciário. Ademais, se a presente interpretação fosse adotada pelo Judiciário, assim como no âmbito dos próprios órgãos da administração, a discricionariedade na livre nomeação e exoneração passaria a sofrer uma incisiva limitação. 

A interpretação sugerida baseia-se, simplesmente, no Princípio da Razoabilidade. Se é necessário a um funcionário efetivo, concursado, provar que é capaz, tanto para conseguir entrar para o serviço público, como para evoluir dentro da carreira, seja em cargo comissionado seja em função de confiança, por que alguém que não ingressa por mérito, mas tão somente por indicação, deve ser dispensado de apresentar qualificações profissionais e técnicas mínimas para o exercício do cargo para o qual está sendo agraciado? 

A Constituição Federal previu e autorizou, a título de exceção à obrigatoriedade da aprovação prévia em concurso público, a investidura em cargo em comissão - declarado em lei de livre nomeação e exoneração, e destinado às funções de direção, chefia e assessoramento. A previsão constitucional, no entanto, não declara que esta forma de provimento possa ser realizada em desarmonia com os princípios norteadores da administração pública ou de outros constantes do texto constitucional. 

Assim, o ato de nomeação pode ser declarado nulo por inconstitucionalidade, com a devida responsabilização da autoridade pública da qual emanou, se afrontar disposições e princípios constitucionais, entre estes: da moralidade, da impessoalidade, da eficiência, da legalidade, da isonomia. Essa análise será baseada nas circunstâncias nas quais se deu a nomeação e, principalmente, nas motivações do ato. 

Mais uma vez, somos forçados a vir à presença de Vossas Senhorias para apelar e denunciar o fato de que a Fiscalização do Município de São Paulo, por não ter uma carreira estruturada, fica exposta a todo o tipo de ingerência, prática maléfica, improdutiva, desonrosa e deletéria ao Serviço Público. 

A falta de estrutura impede que tenhamos um representante competente na Supervisão Geral de Uso e Ocupação do Solo (SGUOS), bem como, cargos de carreira na Supervisão e nas Chefias de Fiscalização, ficando as equipes de Fiscalização sujeitas a deliberações baseadas em simples opiniões sem fundamentos técnicos e, ainda pior, geradas por motivações políticas. 

Tudo isso comprova nossas afirmações de que a falta de uma carreira estruturada, de representante na Supervisão Geral de Uso e Ocupação do Solo (SGUOS), a total desorganização e a ausência de liderança no setor acarretam que, na prática, centenas de “servidores/comissionados” se passem por fiscais urbanos nas ruas de São Paulo.  E mais, muitas vezes atuam de forma ilegal, esfacelando a imagem e honra de toda a categoria dos Agentes Vistores. Estes acabam por pagar a conta de desvios de conduta e de funções de “servidores” que, imiscuídos nas Subprefeituras, se entendem como agentes fiscalizadores, o que na letra da lei não o são. 

Na verdade, a situação caótica que hoje se depreende da falta de estrutura da fiscalização nas Subprefeituras e demais unidades da cidade, colabora diretamente para que “servidores/comissionados” que não são agentes de fiscalização legalmente constituídos, possam exercer este mister, por vezes de forma ilícita. 

Portanto, é imperiosa a estruturação efetiva e urgente da carreira com sua evolução e valorização imediata, na forma do que vimos tentando com a apresentação e sugestão do Projeto de Lei específico (TID nº 10493284 - já protocolizado por esta entidade e aguardando discussão nas mesas setoriais), que engloba a própria reestruturação e reorganização da Fiscalização como um todo na cidade de São Paulo. 

Um amplo trabalho de prevenção foi realizado por esta entidade e categoria junto aos partícipes da campanha, depois componentes da gestão do ora D. Prefeito, no sentido de impedir o aparelhamento dos cargos de gestão nas Subprefeituras por membros do Poder Legislativo. 

Apesar do esforço para evitar que se repetisse uma situação que já se demonstrou danosa e causa de severos prejuízos a esta Municipalidade no passado, tais lamentáveis condutas e fatos começam novamente a ocorrer dentro da atual gestão. Já vêm causando danos irreversíveis e prejuízos irreparáveis à sociedade e à PMSP, tanto que já foi inclusive objeto de denúncia desta Entidade Sindical à Controladoria do Município. 

Trata-se do velho e danoso expediente de vereadores indicando e aparelhando os cargos de gestão de fiscalização no interior das Subprefeituras desta Capital/SP.  O modelo, que já causou enormes prejuízos à coletividade social, bem como ao erário público municipal e parecia definitivamente extirpado da política executiva de nossa cidade, parece retornar com mais força em face de uma aparente inércia ou inépcia em se seguir os princípios constitucionais do estado democrático de direito. 

É um estado de coisas que não se pode aceitar, sob pena de grande e inevitável retrocesso. Os cargos e funções do executivo municipal dentro das Subprefeituras não podem servir de arranjo para o jogo político com o Legislativo, eis que seus deletérios efeitos, conhecidos e tradicionais, causam marcas e cicatrizes profundas em nosso Município. 

Assim, esperamos que D. Parquet Estadual e os Gestores Públicos, aqui Oficiados diretamente, especialmente o Exmo. Dr. Prefeito e seu D. Controlador, estejam muito atentos a este nocivo movimento de aparelhamento do executivo pelo legislativo municipal, afastando e prevenindo tais práticas ilegais, imorais e prejudiciais à nossa cidade e ao serviço público. 

In fine, cumpre-nos consignar que esperaremos que sejam revistas as nomeações, em tese, ilegais e fora dos pressupostos magnos constitucionais da eficiência, legalidade, moralidade, economia e pessoalidade, sob pena de sermos compelidos a questionar judicialmente tanto as nomeações quanto a base legal de onde se originam. 

Colocamo-nos à inteira disposição de todos Vossos Excelentíssimos Senhores para quaisquer eventuais esclarecimentos que se demonstrarem necessários e imperiosos, esperando contar com a sensibilidade de nossos gestores no sentido de evitar esse deletério e ultrapassado aparelhamento, que tanto mal faz a todos nós. 

São Paulo, 18 de outubro de 2013. 

SINDICATO DOS AGENTES VISTORES E AGENTES DE APOIO FISCAL DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO – SAVIM 

Presidente - Maria Benedita Claret Alves Fortunato 

Dr. Pedro Novinsky Pessoa de Barros 

OAB/SP 134.410 – Assessor Jurídico da N. Entidade

 

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